Conto - O Natal de Léo


Ilustração:  Alexandra Koch/Pixabay

Tudo começou com uma curiosidade, típica de criança: “Manhê, como o Papai Noel entrega presentes para TODO mundo à meia-noite?”

A mãe, distraída no computador, respondeu com um simples (e frustrante) “ele é o Papai Noel, Léo. Ele consegue.”

Léo não estava nada satisfeito com a pergunta. 8 anos de idade, mas já tinha discernimento e curiosidade suficiente para ter um nó na cabeça tentando entender como o bom velhinho faz o que faz à meia-noite.

Foi até o pai com a mesma pergunta; o pai, sem saber o que dizer e com medo de falar alguma bobagem que faça o menino não acreditar em Papai Noel, fez uma longa explicação sobre fusos horários, como na verdade esse 1 minuto eram vários, à medida que o Papai Noel ia cruzando as zonas diferentes, e sobe e desce, e vai e volta, um monte de explicações que para Léo não faziam sentido nenhum.

A dúvida persistia; Léo decidiu então tomar o lugar da mãe no computador, enquanto ela ia para a cozinha preparar a janta. O menino entrou no Google e digitou:

COMO PAPAI NOEL ENTREGA PRESENTES PARA TODO MUNDO?

A pesquisa ofereceu 1.345.547 resultados, incluindo lojas de presentes, venda de produtos de decoração e árvores de Natal, cartões de Natal virtuais e mais um monte de coisas que não respondiam. Léo foi passando página por página de resultados, e lá pela página 30, achou um link “fale com o Papai Noel”. Clicou, e o navegador abriu uma pagina com um formulário simples, para a mensagem ser enviada “para o Papai Noel”.

Léo não tinha muito a perder, então preencheu e clicou Enviar.

Foi aí que tudo começou.

As luzes do quarto se apagaram, e foram substituídas por uma mistura de cores, que Léo identificou após alguns segundos como luzes de Natal. Lentamente ele voltou a enxergar e viu que não estava mais em casa.

A primeira coisa que viu foi uma placa “Oficina do Papai Noel – Sem acidentes há 2.345.341.678 dias”.

“Ei, deu certo!!! Eu falei!!!”. O duende do marketing saltitava. “Eu falei que a gente devia usar o formulário do site ao invés de receber cartas!!”.

“Sim, mas era para o formulário trazer crianças para cá?”, o cético duende de TI questionou.

“Veja bem, não era exatamente ISSO que deveria acontecer, mas é válido, pois é uma experiência co-participativa com nosso público-alvo, que permite à nossa empresa se comunicar melhor criando experiências com nossa marca…”

Os outros duendes ignoraram o do Marketing e se dirigiram a Léo. Após garantir que o menino estava bem, o levaram por largos corredores, repletos dos enfeites de Natal mais brilhantes que Léo já tinha visto, com uma luz natural (pelo menos não via fios) que deixava tudo mais bonito. Os corredores eram limpos, e as paredes tinham alguns quadros de aviso, calendários, mapas de planejamento. Tudo muito organizado, como se esperava.

Léo chegou em uma sala de conferência, com um mapa mundi gigante no centro cheio de luzes acesas, indicando vários lares de crianças. O duende do SAC e o duende do Marketing o acomodaram no sofá e começaram a conversar com o menino:

“Pois então, Léo” – disse o do SAC, levantando uma sobrancelha – “o que podemos fazer para lhe ajudar?”

“Bom, é que…” – Léo gaguejava um pouco, ainda não acostumado com tudo que via – “…eu queria saber como o Papai Noel entrega todos os brinquedos”.

O duende do marketing saltou da cadeira. Era sua hora de brilhar. “Veja bem garoto, esquece essa coisa da entrega: o segredo do sucesso está no nosso planejamento estratégico, que começa por manter um mailing atualizado de todos nossos clientes, mantendo-os encantados durante o ano todo até o Natal, quando começa a parte menos interessante, que é a entrega”.

“Que bobagem!” O duende da área técnica entrou na sala. “É Léo seu nome, certo? Amiguinho, a entrega é a parte MAIS importante do Natal. Trabalhamos 365 dias por ano regulando o trenó, mantendo as renas alimentadas e exercitadas, com um controle rigoroso da linha de produção em conjunto com a logística…”

Nessas, entrou o duende do RH na sala, que começava a ficar apertada: “E as pessoas? Coordenamos mais de 5 mil funcionários, que atuam em perfeita harmonia e são constantemente motivados por nós para que tudo dê certo…”. O duende do Financeiro entrou atropelando e falou do budget milimetricamente planejado, que por sua vez foi atropelado pelo de Compras, que falou da importância de ter matérias-primas ideais para realização do serviço…

Lá pelas tantas, quando não cabia mais duendes na sala, o alto-falante da oficina soou, com a voz do duende assistente do Papai Noel:

“Atenção duendes da segurança: favor levar o menino da sala de conferências 2 para a sala do Papai Noel”

Dois duendes de tamanho 3×4 e óculos escuros abriram caminho no mar de empregados de todas as áreas e conduziram Léo por mais uma série de corredores.

À medida que chegava mais perto do destino, os corredores pareciam brilhar com mais intensidade.

Os duendes o deixaram em uma sala grande, com apenas uma mesinha simples de madeira. Na parede, fotos de diversos Natais, confraternizações na oficina, e várias anotações. Em um dos cantos, sacos de cartas de crianças. Na mesa, Léo viu uma bela foto da Mamãe Noel, ao lado de alguns papéis, memorandos e outras coisas deixadas pelos duendes.

Enquanto Léo olhava para o resto da sala, uma mão lhe tocou no ombro. O susto do menino ao ser surpreendido nem se compara ao que tomou quando viu que a mão era do Papai Noel.

“Oi Léo, tudo bem com você?”

“…………………..tudo.” Léo estava perdido.

“Não fica de pé não, Léo; pode sentar, fique à vontade.” Papai Noel foi fazendo sala até o menino se encontrar.

Após alguns minutos de conversa e uns refrescos trazidos pelo duende assistente,

Léo finalmente fez a pergunta que o levou até o Polo Norte:

“Papai Noel, como o senhor faz para entregar presentes para todo mundo à meia-noite?”

E Léo contou as várias versões de todos os duendes para Papai Noel, que ouviu com muita calma.

“Léo, apesar dos meus duendes terem se empolgado um pouco, todos eles falaram a verdade. Olha aqui para a televisão, deixa te mostrar um pouco do que a gente faz.” E a TV de plasma da parede ligou. Papai Noel começou a dar diversas explicações, sobre como cada departamento faz sua parte de maneira bem harmoniosa e com igual importância.

Durante o ano, a área de marketing mantém vivo o interesse de todo mundo no Natal para que todos enfeitem bem as casas e os duendes saibam onde entregar os presentes. A área comercial faz a captação dos pedidos via carta e faz a ligação com a área de compras e financeira, que providenciam todos os produtos que vão para a logística, que arruma as embalagens para cada criança. Dali, os presentes são preparados para entrar não em um trenó, mas em vários, todos bem preparados pela área técnica, com os duendes pilotos esperando. Os trenós percorrem o mundo e distribuem os presentes.

Léo ia ouvindo a explicação e ficando desanimado.

Então não era Papai Noel que entregava os presentes? O menino era pura desolação, vendo a fantasia ruir, mas Papai Noel não perdia o sorriso.

“Agora Léo, você vem comigo que eu vou te mostrar a minha parte”.

Léo ficou confuso. Mas os duendes não faziam tudo sozinhos? Passou com Papai Noel pelos corredores até chegar a um enorme hangar em uma das pontas da oficina, onde vários duendes já partiam para diversos pontos do mundo, com os trenós cheios de presentes. O menino e Papai Noel se dirigiram para a plataforma principal, onde estava estacionado o trenó principal.

O velhinho acomodou Léo no banco do passageiro e subiu no trenó. Era quase meia-noite, e os dois partiram.

Após mais ou menos uns 10 segundos de viagem, chegaram na cidade. Lá, um senhor dormia na rua, passando frio, abraçado a uma garrafa de pinga. A rua estava fria, feia e triste, sem nenhuma luz ou cuidado.

Papai Noel desceu do trenó. Léo, do banco do passageiro, viu Papai Noel tocar de leve a cabeça do mendigo, que se levantou após alguns instantes, sorriso na cara. Começou a se dirigir para o albergue do outro lado da rua, onde as luzes acesas e os sons eram certamente bem melhores que a rua.

Léo achou estranho, tentou perguntar algo, mas Papai Noel subiu no trenó e acelerou de novo. O trenó subiu, subiu, subiu até um ponto muito alto da cidade, na cobertura de um prédio.

Lá dentro, um outro senhor, só diferente daquele que dormia na rua nas roupas e conforto do lar, jantava sozinho uma ceia que parecia ter sido feita para 20 pessoas, rodeado de quadros caros, esculturas raras, talheres de prata e enfeites de ouro.

Nada na casa indicava que era Natal, tudo era muito escuro e pouco convidativo, de muitas maneiras parecido com o beco escuro onde o mendigo dormia.

Papai Noel se aproximou do homem e tocou-lhe no peito. No mesmo instante ele levantou da mesa, com olhar determinado. Juntou toda a comida da mesa em cestos improvisados, ainda buscou mais coisas da dispensa e correu até o elevador.

Papai Noel e Léo desceram no trenó, seguindo o homem, que se dirigiu ao mesmo albergue onde o mendigo entrou.

Do lado de fora, os dois olharam para dentro do albergue. Lá, o homem rico distribuía sua ceia, enchendo os pratos de todos, inclusive o do mendigo, que depois de um grande jantar começou a cantar para todos que lá estavam, com uma voz que espalhava alegria. Todos estavam muito felizes, e Léo ficou muito feliz com o que viu também.

“Léo,” – Papai Noel bateu no ombro do menino, ainda encantado com o que via – “agora sim você entende o que eu faço, e a importância disso. Dar presentes qualquer um pode dar, mas

o Natal serve para darmos esperança para quem tem pouco e bondade para quem tem muito”.

A próxima viagem de Papai Noel e Léo foi para a casa do menino, onde o velhinho o deixou a tempo da ceia com a família.

Ao ver Léo, o pai disse:

“Afe menino, aí está você!! Achei que você fosse perder isso…olha o que o Papai Noel te trouxe!!”

E o pai entra no quarto com uma bicicleta novinha, do jeito que Léo queria.

O menino olhou para o pai, sorriu e disse:

“Ih pai, isso não é nada…você tem que ver o que o Papai Noel me deu esse ano…”

Por: Autor Desconhecido | Fonte: Refletir para Refletir